IMAGINÁRIO EM PERPÉTUA CRIAÇÃO

Porque você (não) deve ler autoajuda

talvez você precise de ajuda, mas não possa se ajudar...

Edu Berlim

7/28/20254 min read

Esse é um texto estranho, confesso. Por isso, deixem-me primeiro contextualizar vocês sobre algumas coisas antes de entrar em um tema que parece completamente aleatório.

Nestes últimos meses tenho me dedicado a algumas coisas, sendo o trabalho em redes sociais uma delas. Para ser mais específico, um trabalho de divulgação no Instagram sobre projetos que tenho para o futuro. Comecei a postar uma série de vídeos no @edu.berlim sobre as virtudes, os pecados capitais e sobre arte – com uma indicação de música, livro ou obra audiovisual em um carrossel toda quinta-feira.

Quando encaixei uma rotina decente, passei a interagir mais nos stories da rede – o que, confesso, não me é tão aprazível. É um lugar quase interessante, especialmente pelas caixinhas de perguntas e pelas opiniões que recebo e as conversas que iniciam. Ocorre que esta semana, falei sobre um livro terrivelmente ruim que estava lendo: ‘O Milagre da Manhã’, de Hal Elrod.

Sim, é um livro de autoajuda. E aqui começa o tema deste texto: o porquê você deve (e não deve) ler esse tipo de obra. Neste ponto, vale um disclaimer importante sobre o tempo que dedicamos à leitura de alguma coisa (já que temos um tempo bastante limitado). Um livro como este, que mal chega a 200 páginas e tem uma linguagem ridiculamente simples, não me toma mais do que duas horas. Isso significa que li parte dele antes de dormir em uma noite e o terminei no café da manhã do dia seguinte. Minha carga de leitura atual exige que eu tenha não só variedade, mas alguns tipos de distração inútil – e este livro se encaixa perfeitamente na distração imbecil e inútil a que me refiro.

Livros de autoajuda possuem duas famas paralelas: existem pessoas que enxergam neles uma espécie de salvação, a redenção para uma vida triste e perdida; e existem os que classificam todas as obras do gênero como charlatanismo. Devo dizer que as duas visões são erradas, sem qualquer dúvida.

Em primeiro lugar, há o problema da classificação. Livros como “+ Esperto que o Diabo”, “O Milagre da Manhã” e qualquer coisa do Tony Robbins são uma espécie de autoajuda chinfrim, de qualidade terrivelmente duvidosa, e sem grandes “macetes para a vida” que não estejam apontados em absolutamente todos os lugares ao nosso redor. Mas devemos lembrar que livros como “Rápido e Devagar”, “O Ponto de Mutação” e até mesmo a filosofia estoica tendem a ser classificados como autoajuda por aí. E isso é uma completa aberração.

A especialista em marketing que tem me auxiliado com aulas fantásticas (e que talvez se torne minha mentora, eu espero) estava falando sobre o “crime” que reside nos leitores arrogantes que descartam por completo livros de autoajuda, trazendo soluções como “você deveria ler Platão, não essas merdas” e ela tem toda razão em dizer isso. Eu sou a pessoa que recomenda leituras sérias e entendo bem que há leitores que não estão minimamente preparados para ler Sêneca, Aristóteles ou qualquer coisa mais densa que um gibi do Maurício de Souza ou uma baboseira no pior sentido Colleen Hoover.

Para estas pessoas (e este pode ser o teu caso), algo como ‘O Milagre da Manhã’ pode ser uma redenção, uma salvação simples possível se você ignorar a autopropaganda constante, as merdas bizarras que ele fala sobre “ler apenas autoajuda” e toda e qualquer indicação dele de leitura. Mas o lance de acordar cedo, começar o dia bem, fazer uma meditação leve, algum exercício físico e ler algo antes de começar o dia não é apenas uma fórmula mágica, mas parte do meu próprio estilo de vida. Eu leio com muita constância, faço exercícios físicos regularmente, medito diariamente e faço afirmações diárias do tipo “(...) livrai-nos do mal. Amém”. Atualmente, estou descobrindo o quão prazeroso pode ser acordar cedo – cedo pelos meus padrões, pelo menos.

Entenda que existem níveis de leitores nos mais variados temas. No ocultismo há quem está tendo os primeiros contatos com um Caibalion da vida, gente nos livros do Marcelo Del Debbio, leitores vorazes de grimórios que podem ou não ser uma coleção de groselhas de pozinho, gente lendo o Pistis Sophia, C.S. Lewis e até maluco estudando grego koiné para ler adequadamente o Novo Testamento. Nem todos esses níveis são ruins, nem todos são bons. Alguns até são uma merda, mas são o começo do começo. Eu acho o Caibalion um ótimo calço de mesa, mas eu comecei por lá e isso não me dá o direito de desprezar quem começa por ele – e depois parte para drogas mais pesadas ou pelo menos para uma leitura que não pareça um conto do Julio Verne.

Ler absolutamente tudo do Del Debbio (tudo mesmo) me permitiu chegar a discordâncias com o trabalho dele, dá mesma forma que ler Lewis cultivou em mim uma paixão enorme por algo que eu desprezava há alguns anos. Respeito muitíssimo esses dois autores por sua obra e por seu caráter, independentemente de qualquer coisa. Mas eu não sou capaz de respeitar o Hal Elrod com o seu “milagre da manhã” ou o Atkinson e história de “três iniciados” com ares milagreiros.

Nisso tudo, uma coisa é certa: o ocultista que replica os “eu crio enquanto eu falo” não tem muito poder de barganha na hora de criticar as afirmações positivas da PNL de um Tony Robbins ou ‘O Milagre da Manhã’ que promete uma vida incrível apenas dizendo “eu acordo cedo e o meu dia é como uma manhã de Natal!”. Se a palavra cria, ela cria para todos – e pouco importa se ela é uma pílula diluída no Lago Titicaca ou se é o próprio Logus (e não, não é só o GPT que usa travessão – eu também me amarro nisso – viu?).

Por fim, eu não acho que você deva ler autoajuda. A não ser que tu precise dela. Neste caso, ela pode ser um ponto de partida, um Caibalion com intuito de organizar a tua vida. Só não crie fetiche. Leia outras coisas depois e aplique a desgraça do que você leu. Isso pode realmente ser útil pra você...