IMAGINÁRIO EM PERPÉTUA CRIAÇÃO

Calvin não pode ignorar a realidade...

E você menos ainda

Eduardo Berlim

5/26/20252 min read

Você pode ignorar a realidade, mas não pode ignorar as consequências de ignorar a realidade”. Esta frase é comumente atribuída a Ayn Rand, uma escritora e filósofa americana de origem judaico-russa conhecida pela criação do Objetivismo e por seus romances. Em ‘A Virtude do Egoísmo’, Rand aborda a ideia de um egoísmo que pode funcionar como um código de ética racional na medida em que ‘buscar o melhor para si é estar a serviço dos outros’ em uma contraposição a um altruísmo que tem serventia apenas para o ‘sentir-se bem sem um esforço verdadeiro’.

Seu herdeiro filosófico, o canadense-americano Leonard S. Peikoff, deu uma estrutura mais formal ao Objetivismo, classificando-o como um “sistema fechado que não está sujeito a mudanças”. Rand diria que o cerne deste pensamento está no “conceito do homem como um ser heroico, com sua própria felicidade como o propósito moral de sua vida, com a realização produtiva como sua atividade mais nobre e a razão como seu único absoluto".

Na tirinha, temos o pequeno Calvin buscando uma resposta que ainda é inadequada aos seus seis anos de idade. A falta de preparo em confrontar a realidade última faz com que o pai lhe dê uma resposta irreal, mas absolutamente terrificante para o pequeno. Na ausência do conhecimento necessário para recebermos determinada resposta é comum que sejamos confrontados com a irrealidade, com a mentira ou com o abstrato incompreensível. Neste momento, é bastante comum que façamos a opção por “ignorar a realidade”, pois ela não se adequa a nossa própria falta de compreensão do mundo.

Se analisarmos bem, o absurdo da tirinha passa longe da resposta do pai: ele reside no fato de uma criança de seis anos saber diferenciar uma loja de departamentos de um supermercado. A resposta que o menino recebe é o famoso “você não é um iniciado” ou o ainda mais famoso “esta resposta não pertence ao teu grau no templo” (que costuma ser uma boa desculpa para o instrutor que não tem a resposta que você quer), mas não perceber que uma criança de seis anos dificilmente compreenderia a diferença entre um supermercado e uma loja de departamentos aponta apenas para a falta de compreensão do leitor frente ao absurdo.

Novamente: você pode tentar ignorar a realidade o quanto quiser, mas nada te fará ignorar as consequências diretas disso. Não me surpreende saber que pessoas acharam esta tirinha “um absurdo” porque o pai “foi cruel com a criança”. Isso só ocorre com um relativismo do que é real, gerando pessoas reativas mesmo ao humor e ao absurdo. Perceber que Calvin é capaz compreender coisas incompreensíveis a crianças de sua idade é compreender que há um sarcasmo latente desde o início da tirinha, mas não perceber este detalhe ao mesmo tempo em que acredita que, de alguma forma, a ação do pai foi cruel enquanto realidade é entregar-se ao absurdo de uma vida tão caricata que faria o falante tigre Haroldo parecer real.