IMAGINÁRIO EM PERPÉTUA CRIAÇÃO
A morte representada na música do mundo
hello, darkness, my old friend...
Eduardo Berlim
1/15/20253 min read


“Porque que que o tal ser humano já nasce sabendo do fim?”, disse Oswaldo Montenegro em uma de suas canções. Não é nenhum segredo que tememos a morte e nossa vida inteira é uma batalha contra o inevitável. É natural que o ser humano represente a morte como algo forte e poderoso, seja nas festas de Santa Muerte do México, nas cerimônias Shraddha ou no lamento fúnebre dos poemas de Álvares de Azevedo.
A arte imita a vida e por isso a arte precisa falar sobre a morte. Se isso lhe dá qualquer gatilho, eu recomendo que você pare de ler esse texto neste exato momento. Mais do que “não estragar” umas músicas que você ouve no churrasco de família, o tema não lhe será adequado neste momento. Lembre-se que se você precisar de ajuda, o CVV atende pelo 188 a qualquer momento do dia.
Naquela Mesa, conhecida pela voz de Nelson Gonçalves, é uma letra de Sérgio Bittencourt. Na canção, ele narra as dores de quem vê a mesa vazia pela ausência do bandolim sempre constante de seu pai. Jacob do Bandolim morreu nos braços de sua esposa ao chegar na varanda de casa devido aos seus problemas cardíacos. Seu filho, que também morreu jovem, compôs a música denotando a ausência do pai com frases de caráter personalíssimo.
Outro sambista que narrou a morte em uma canção foi o saudoso João Nogueira. Espelho narra as saudades do pai falecido. A canção estranhamente parece se referir ao seu filho, Diogo Nogueira, pelas coincidências entre a jovem vida do garoto e vida de seu falecido pai. Mas na inocência de sua pouca idade, Diogo viu o espelho se quebrar com a morte precoce de seu pai, vítima de infarto. Hoje a música conta não apenas a história de João Nogueira, mas também de João Nogueira Júnior.
Provavelmente uma das músicas mais mal interpretadas da atualidade, Velocidade da Luz narra o desejo de suicídio de alguém que perdeu o amor de sua vida. Todo mundo erra na interpretação da música e parece uma grave Revelação perceber que “ir embora para outro planeta na velocidade da luz” é uma metáfora sutil para a morte, mas que “eu vou solitário e frio para onde a morte me aqueça” não é tão sutil assim.
Outra música comumente mal interpretada é Pais e Filhos, da Legião Urbana. Não foram poucas as entrevistas em que Renato Russo disse abertamente que a música trata da temática do suicídio. A música que se inicia com “ela se jogou da janela do quinto andar” parece mostrar um filme em que vemos as conversas de cada apartamento conforme a menina despenca. Há quem quer colo, há quem quer fugir de casa, uma criança com medo, alguém que sai de casa e só voltará depois das três... E aparentemente ninguém percebe a queda, indiferentes dentro de suas próprias vidas sem olhar para fora da janela. Este é o desencontro de gerações que Renato narra durante toda a música, que parece não se encaixar e ser feita de frases soltas com um efeito metafórico bastante proposital.
Por fim, uma de minhas músicas favoritas, The Show Must Go On, do Queen, é uma canção do guitarrista Brian May sobre o esforço de Freddie Mercury em gravar o álbum Innuendo enquanto sua vida se aproximava do fim. As complicações da AIDS de Freddie já surgiam e devastavam sua força vital, mas não havia publicidade sobre isso ainda. Havia dúvidas se ele seria capaz de gravar a canção, que possui uma altíssima exigência vocal e é considerada umas das músicas mais vocalicamente desafiadoras da banda, mas Freddie a gravou em um único take. O álbum foi lançado em 14 de outubro de 1991 e Freddie morreu no dia 24 de novembro do mesmo ano. Em 1992 o show continuou e a música foi tocada pela primeira vez ao vivo, durante uma apresentação em homenagem ao cantor e foi interpretada por Elton John.




